Toda vez que aumenta o tom de debates sobre defensivos agrícolas, sinto que se corre o risco de perder um pouco da dimensão histórica da questão fitossanitária. Ela sempre esteve atrelada à evolução do mercado de alimentos, primeiro na perspectiva de segurança alimentar, depois no foco da qualidade dos produtos e, mais recentemente, também com a ênfase na segurança dos alimentos.
Estão comendo mais frutas, legumes e verduras, principalmente as mulheres. É o que mostra a Pesquisa Vigitel** do Ministério da Saúde, feita em 2018 e divulgada em julho último, indicando um aumento de 15,5% no consumo regular de hortaliças e frutas, nos últimos dez anos. Esse consumo está mais concentrado entre as mulheres (27,2%) e ocorre em nome da adoção de “hábitos mais saudáveis” de alimentação. O estudo consultou 52.395 pessoas, em 26 Capitais, mais o Distrito Federal, Brasília.
Essa valorização dos hortifrutis pode representar cenários ainda mais favoráveis no futuro: são as mulheres que estão liderando essa tendência de comportamento e é delas, principalmente, o papel essencial de educação alimentar das crianças, que podem assim crescer com uma visão mais engajada em torno das frutas, legumes e verduras. Traduzindo: há, no horizonte, sinais bem positivos para a horticultura. Mas, para potencializar esse cenário como oportunidade, como pode o produtor se organizar, em termos de marketing?
Qualidade premium, rastreabilidade, certificações, selos de origem, design de embalagem, novos canais de distribuição, conveniência de acesso, associativismo, criação de marcas, comunicação, tudo pode contribuir para capitalizar melhor os hortifrutis, na percepção do consumidor. Lembrando sempre: uma marca bem trabalhada tira o produto e o produtor do anonimato, diferencia, adiciona valor percebido e preferência pelos produtos.
O processamento também pode ser uma alternativa. De preferência com simplicidade e criatividade. Simplicidade para ficar o mais próximo possível do natural, conceito que é cada vez mais valorizado pelas pessoas. E criatividade para construir, na mente do consumidor, imagem e desejo muito além do produto em si. Um caso clássico dessa estratégia é o dos produtores de uva passa da Califórnia, Estados Unidos, que transformaram seu produto de ingrediente secundário em sucesso de vendas no mercado de snacks.
Aliás, o snack, também chamado de “lanchinho” entre nós (e já foi “belisco”), é a categoria de maior sucesso da indústria alimentícia, com crescimento anual expressivo, na casa dos 60%. Fruta pode se tornar snack, como já acontece com maça, abacaxi e mamão. Mas é possível inovar e outro dia escutei de um fruticultor de São Paulo, ideias de aproveitar o caqui para snacks e compotas. E ainda sempre será possível segmentar os produtos por características, sabor, porções, funcionalidade para a saúde e modas de alimentação.
Atrair o consumidor até a propriedade, para uma experiência diferenciada, é outra estratégia que começa a despontar. É o chamado “frutiturismo”, principalmente do tipo “colha e pague”, com o turista visitando as plantações, vendo ao vivo como se faz o cultivo e depois colhendo os frutos “no pé”. Naturalmente, exige algum investimento em estrutura (sanitários e pontos de descanso), treinamento e divulgação. Mas responde a um interesse crescente das famílias urbanas, de resgatar elos com o campo e o convívio com a natureza.
O que esses exemplos têm em comum? Senso de oportunidade: estar ligado no mercado, interpretando suas transformações e criando alternativas de renda a partir delas. Pode ser com melhor qualidade de produto, distribuição ampliada ou atendendo à demanda por alimentos saudáveis e sensorialmente atraentes. A horticultura pode ficar de olho nessa horta. Pelo que revela a pesquisa do Ministério da Saúde, o mercado vai estar a seu favor.
Fonte: Destaque Rural