19.3 C
Franca
novembro 25, 2024
Agricultura

Arborizar o cafezal favorece a sustentabilidade do solo. Mas, e a produtividade?

Por Mário Bittencourt*

A discussão é antiga e parecia já encerrada na cafeicultura mais comercial, mas, com as cobranças por uma agricultura mais sustentável, ela tem voltado à evidência: arborizar ou não o cafezal?

Ao longo de décadas, estudos mostraram os mais variados benefícios do manejo de produção de café em áreas onde as plantas ficam sombreadas, ou arborizadas.

Dentre eles, apontam os pesquisadores em Produção Vegetal Marcos Silveira Bernardes e Carlos Armenio Khatounian, no artigo “Cafeicultura a pleno sol supera o vantajoso sistema agroflorestal”, estão a melhoria na qualidade do fruto de da bebida, com produção de frutos maiores, tamanhos uniformes e bebidas com melhor aroma e corpo.

Em sistemas de plantios de café arborizados também ocorre aumento da eficiência no uso da água e do nitrogênio, a redução do índice de bienalidade (mais intenso no café do tipo arábica), da infestação de plantas daninhas e do ataque do bicho-mineiro, bem como da temperatura do solo e da velocidade da mineralização da matéria orgânica.

Árvores no cafezal contribuem ainda para a redução dos extremos de temperatura no microclima da área de produção, e atenuam ou mesmo eliminam danos causados por geadas ou altas temperaturas, como a escaldadura foliar. Ocorre, ainda, a manutenção da produtividade por planta, com sombreamento de até 30%, em comparação com o pleno sol.

E por qual motivo, então, quase não vemos árvores nos cafezais Brasil, como ocorre em outros países? A resposta é simples: as condições climáticas do país permitiram o desenvolvimento da produção de café com altas produtividades a pleno sol, ao contrário de outras nações.

A discussão é semelhante a que ocorre hoje com relação à produção de cacau, tradicionalmente realizada no sistema cabruca, em que grandes árvores fazem o sombreamento dos cacaueiros.

Mas, no oeste da Bahia, a produção de cacau tem se desenvolvido mais até que a do Pará (maior produtor nacional), e em áreas de plantação a pleno sol. A produtividade do oeste é 211% maior que a do estado amazônico.

Recentemente, informamos no Minuto do Agronegócio, na Band FM Conquista, que produtores do cerrado mineiro estão desenvolvendo a cafeicultura regenerativa: é a união de técnicas antigas com inovações do presente para uma agricultura de baixo carbono.

Por meio dessas práticas, as lavouras de café absorvem mais gás carbônico do que emitem. O desafio do momento é buscar um meio de os compradores valorizarem esta iniciativa e pagar mais caro pelo café produzido neste sistema.

Enquanto isso não ocorre, outras pesquisas vão sendo desenvolvidas para promover a sustentabilidade na cafeicultura.

Na Bahia, a agrônoma Anny Karoline Rocha Quirino mostrou em sua pesquisa para a dissertação de mestrado em Agronomia que o manejo de café em consórcio com a grevílea, uma árvore comum nos trópicos, influencia positivamente a biomassa e a atividade de microorganismos no solo.

Realizada na Fazenda Viçosa, em Vitória da Conquista, a pesquisa foi divulgada recentemente no Programa de Pós Graduação em Agronomia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb).

A agrônoma Anny Karoline concluiu que “os indicadores de qualidade do solo avaliados neste estudo permitiram, de forma geral, detectar efeitos do uso da terra sobre as propriedades biológicas do solo”.

Apesar de o estudo não abordar a relação entre sombreamento e produtividade, um ponto que também interessa muito aos cafeicultores, ele serve para confirmar outras pesquisas sobre o mesmo assunto e cujos resultados vão no mesmo sentido.

Uma outra pesquisa sobre arborização do café, mas desta vez na variedade conilon, cuja produção no Brasil é concentrada (95%) nos estados do Espírito Santo, Bahia e Rondônia, apresenta luz sobre o tema, com relatos sobre os efeitos positivos do sombreamento na produtividade do café.

O estudo – uma revisão de literatura e intitulado “Arborização em café conilon: aspectos microclimáticos, fisiológicos e nutricionais” – é de autoria dos pesquisadores Paulo Cezar Cavatte, Wagner Nunes Rodrigues, José Francisco Teixeira do Amaral, Sara Maria Andrade Pereira e Luan Peroni Venâncio.  

A arborização do café conilon, de acordo com a pesquisa, tem se tornado cada vez mais frequente no Estado do Espírito Santo. Diferentes espécies têm sido empregadas: cedro australiano (Toona ciliate), seringueira (Hevea brasiliensis) e teca (Tectona grandis) são as mais comuns.

Também são encontrados sistemas arborizados com macadâmia (Macadamia integrifolia), pupunha (Bactris gasipaes), grevilha (Grevillea robusta), ingá (Inga sp.), nim (Azadiracha indica), peroba (Paractecoma peroba) e urucum (Bixa orellana).

Os pesquisadores sublinham que, no geral, observa-se que a produtividade do café em sistemas arborizados é inferior a sistemas a pleno sol, quando o cultivo é realizado em condições ambientais adequadas e uso intensivo de insumos agrícolas.

No entanto, “dependendo das condições edafoclimáticas da região e da densidade de cultivo, a arborização pode não ter efeito sobre a produção de frutos das plantas de café, e em alguns casos pode até mesmo estimular esse processo”.

Para regiões tropicais, por exemplo, “a arborização deve proporcionar sombreamento de cerca de 20% da superfície do terreno, já que o excesso pode ser prejudicial à produção dos cafeeiros”, eles escreveram.

Outros estudos, segundo relatam os pesquisadores, avaliaram a produtividade do cafeeiro arborizado com diferentes espécies ao longo de seis anos e verificaram que, apesar das diferentes espécies arbóreas promoverem diferentes níveis de produção, não houve prejuízos sobre a produtividade do cafeeiro.

Os mesmos autores afirmam ainda que a arborização com seringueira e grevílea teve efeito benéfico sobre a produtividade do cafeeiro, quando comparado ao tratamento conduzido a pleno sol.

O efeito negativo sobre a produtividade do cafeeiro em sistemas arborizados pode estar relacionada, conforme observam os pesquisadores, com o estímulo causado pelo sombreamento sobre a diferenciação das gemas, favorecendo a emissão de gemas vegetativas em detrimento de gemas florais.

“A menor produção de frutos em sistemas arborizados também pode estar relacionada com a menor assimilação de carbono, devido a menor disponibilidade de luz, consequente do sombreamento excessivo do sistema”, sugerem.

*Mário Bittencourt é jornalista especializado na cobertura do agronegócio, com pós-graduação em Análise do Espaço Geográfico e em Comunicação e Marketing nas Redes Sociais. É colunista de agronegócio da Band FM em Vitória da Conquista e já atuou como repórter dos jornais A Tarde, Correio e Folha de S.Paulo.

Related posts

Publicado zoneamento agrícola do feijão 2ª safra para 2022/2023

Fabrício Guimarães

Preço em queda põe em xeque aumento da área de algodão

Fabrício Guimarães

Preços do milho seguem caindo

Fabrício Guimarães

Deixe um comentário

Usamos cookies para melhorar sua experiência no site. Aceitar Leia Mais