Lei antidesmate da UE acelera exportações de café do Brasil

Portos europeus vêm registrando movimento acima do normal; caos logístico não está descartado

Uma consequência de antecipação ao vigor do Regulamento de Produtos Livres de Desmatamento da União Europeia (EUDR), que inicia em 30 de dezembro, vem sendo notada nos portos europeus, com filas e lotação, segundo agências internacionais. Os próximos meses devem registrar mais congestionamentos, e um potencial caos logístico não está descartado.

Os embarques de café brasileiro, principalmente a países da Europa, estão acelerados. O relatório recentemente publicado pelo braço de agro do banco holandês Rabobank, mostra que as exportações de janeiro a julho chegaram a 28,1 milhões de sacas de 60 quilos, um crescimento de 46% em comparação a 2023.

Nos últimos sete meses, a exportação do Brasil para a União Europeia subiu quase 65%, segundo dados do Conselho de Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) e reforçados pelo relatório do banco.

“Com o Regulamento de Produtos Livres de Desmatamento da União Europeia (EUDR) previsto para entrar em vigor em 2025, as exportações do Brasil para a UE aumentaram 64,9% em 2024, totalizando 13,3 milhões de sacas. Atualmente, o bloco representa 47,3% das exportações de café do Brasil”, explica o analista Guilherme Morya, que assina o relatório do Rabobank.

Isso porque o regulamento exigirá que os importadores do bloco provem que commodities como o café, a carne bovina, o cacau e a madeira não contribuem para a destruição de áreas florestais.

Outros exportadores

As exportações de café arábica registraram um aumento significativo, subindo 31% em 2024 e alcançando 20,7 milhões de sacas. As vendas de conilon somaram 5,2 milhões de sacas este ano, um aumento de 314% em relação a 2023. Esse crescimento também é impulsionado por restrições de oferta no Vietnã e na Indonésia, acrescenta o Rabobank.

Se, de um lado, as cargas de café estão enchendo os portos europeus, de outro, os comercializadores estão estocando com receio da falta do produto na safra 2025/26, em especial devido à seca que atinge o maior produtor e exportador mundial, o Brasil.

Mas não são apenas cargas do Brasil que estão enchendo os portos europeus. O país africano Uganda, por exemplo, é o principal fornecedor de café robusta, nativo da floresta Kibale, para a Europa e também deu um impulso nos embarques ao continente devido à lei antidesmate.

Atualmente, Uganda é responsável por pelo menos 60% do robusta que entra nos países europeus. Segundo uma revista especializada do país, a Rijksoverheid, a agricultura é o maior setor da Uganda, empregando aproximadamente 72% da força de trabalho e respondendo por 24% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Entretanto, em razão do sistema agrícola ser familiar, comunitário e de pequena escala, os produtores não estão capitalizados para investir em ajustes, especialmente os mais tecnológicos, como rastreabilidade e georreferenciamento.

“O setor cafeeiro precisa de se preparar para o EUDR, uma vez que o regulamento entrará em vigor até o final de 2024. Emprega cerca de 1,8 milhões de pequenos agricultores que exportam principalmente o seu café. O setor é responsável por 22% do total das exportações do Uganda”, informa o veículo.

A próxima safra de robusta no país será em outubro, e as autoridades locais têm manifestado que haverá tempo de embarque antes de 30 de dezembro, considerando que, em média, leva-se 70 dias após a saída pela África do Sul e o tempo de processamento, o que deve assegurar que quase todo o café da próxima safra terá que estar em conformidade com o EUDR.

O país teria mais entrada na Europa devido às condições climáticas que quebraram safras dos exportadores asiáticos, em especial do Vietnã e Indonésia – principais produtores de conilon do mundo. Lá, além do café, o cacau também entra na lista das novas normas europeias.

Com isso, outubro deverá ser um mês de altas cargas nos portos europeus, já que poucos agentes de mercado deverão arriscar mandar lotes de grãos sem que estejam certificados e atendendo o regulamento.

De acordo com avaliação dos portos europeus encontrada no site oficial da Comissão Europeia, “os estrangulamentos” nesses locais e no seu interior podem ocorrer “devido a infraestruturas ou serviços inadequados que podem resultar em congestionamentos adicionais, emissões adicionais e custos adicionais para os expedidores, os operadores de transportes, os consumidores e a sociedade em geral”.

Volatilidade internacional

Em agosto, os preços do café no Brasil continuam altos, impulsionados por incertezas na oferta de robusta, condições climáticas adversas e participação significativa de fundos não comerciais em Nova York.

Assim, tais condições e volatilidade no mercado internacional fizeram o Rabobank reduzir a previsão da safra 2024/25 de 69,8 milhões de sacas (60 kg) para 67,1 milhões de sacas, devido a menores rendimentos e tamanho de peneira.

Há, ainda, um movimento de entidades como Cecafé e grandes traders de aproveitar a emergência de mercados chaves, como a China: o país fechou um contrato recente com a maior distribuidora de café asiática, Luckin Coffee, e que levantará cerca de US$ 500 milhões por ano com a venda do produto brasileiro.

Origens produtoras, como México, Indonésia e Vietnã, também aumentaram acima dos 200% a compra de grão arábica brasileiro entre o segundo semestre de 2023 e os primeiros seis meses deste ano. Há negociações, inclusive, para o conilon e robusta do Brasil, segundo apuração da reportagem.

A tendência deve dinamizar as exportações brasileiras, enquanto entidades setoriais asseguram que o Brasil é o país mais preparado para atender regras rígidas globais de sustentabilidade, como já afirmou o diretor-geral do Cecafé, Marcos Matos, durante eventos recentes do segmento.

A poucos meses de começar para valer, o caminho com a EUDR continua incerto, pois muitos países com produções menores, mas que ajudam a abastecer o comércio de café na Europa, não estão preparados ou não têm recursos para investir nos ajustes necessários, enquanto o Brasil tenta avançar em georreferenciamento. Outro fator de incerteza é que a Comissão Europeia ainda não publicou todos os detalhes da implementação da nova lei.

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