Restauração ambiental na fazenda: não adotar ações pode custar caro

Especialistas chamam a atenção para a urgência do engajamento dos produtores rurais

Calcular o custo de não implementar ações voltadas à preservação ambiental na propriedade rural é fundamental nos dias atuais. A observação é de Fabíola Zerbini, diretora de Florestas da Secretaria de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Ela participou, nesta terça-feira (10/09), do painel de abertura do CBSementes – Congresso Brasileiro de Sementes, em Foz do Iguaçu (PR).

“O produtor precisa começar a internalizar o custo da não implementação dessas ações – o que, muitas vezes, vai gerar aumento no custo de irrigação e de tratamento de solo e vai reduzir a produtividade por hectare. Isso precisa ser colocado numa balança”, ressalta, em entrevista à Globo Rural.

Frente às mudanças climáticas, ela salienta a importância de um movimento não somente individualizado, mas em níveis globais. “O clima é um elemento de risco para o agro; por isso, é preciso uma gestão climática na fazenda, com a restauração ambiental incluída. Mas precisamos avançar juntos na regularização, com engajamento do setor econômico mundial e do produtor rural”, adverte.

Recuperação

Desde o Acordo de Paris em 2015, reafirmado em 2017, o Brasil estabeleceu a meta de recuperar 12 milhões de hectares de vegetação nativa até 2030, com base no passivo do Código Florestal. No entanto, segundo Fabíola, não há um sistema público oficial que indique exatamente o progresso dessa meta, somente plataformas privadas de monitoramento, como o Observatório da Restauração e Reflorestamento.

A diretora chamou a atenção para a política nacional de restauração que está sendo revista por meio do Plano Nacional de Vegetação Nativa (Planaveg), que propõe uma série de ações para garantir que as sementes nativas tenham um marco regulatório robusto. “Isso não só facilita o acesso dos produtores a essas sementes, como também impulsiona a regularização ambiental das propriedades e a implementação do Código Florestal”, avalia.

Fabíola Zerbini participou da abertura do Congresso Brasileiro de Sementes, em Foz do Iguaçu (PR) — Foto: Valdecir Gomes da Silva

O Planaveg prevê a criação de uma plataforma pública que integre vários sistemas, como o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), o Cadastro Ambiental Rural (CAR), além dos planos de regularização ambiental e a leitura da vegetação secundária via o projeto TerraClass. “Essa integração é fundamental para garantir uma visão clara do que está sendo recuperado anualmente, seja por reforçamento, regeneração natural ou restauração ecológica”, diz a diretora de Floresta.

De acordo com ela, essa plataforma deve entrar em funcionamento em 2025, com áreas para informações públicas e privadas, a fim de garantir maior credibilidade e transparência.

Fabíola lembra ainda que, dos 12 milhões de hectares de vegetação nativa no Brasil, 9 milhões de hectares estão em propriedades rurais, conforme dados da diretoria de Florestas do MMA. “Sem o produtor rural, sem o agro, a gente não vai avançar nessas agendas que buscam equilíbrio climático. A agenda de recuperação passa necessariamente por engajamento”, alerta. Ela acrescentou a necessidade de políticas de incentivos perenes nas esferas públicas, a fim de estimular a regularização.

Simpósio

Durante a programação do CBSementes foi realizado, também nesta terça-feira, o Simpósio Brasileiro de Tecnologias de Sementes Florestais. A cadeia de sementes e mudas no Brasil é um dos maiores mercados mundiais do segmento. O país possui 500 milhões de hectares de florestas nativas e 8 milhões de hectares de exóticas plantadas.

Bárbara Dantas, coordenadora do Comitê Técnico de Sementes Florestais e organizadora do simpósio, destacou o ganho de visibilidade para o tema, ao ser debatido em um congresso em que as commodities, como soja e grãos, estão no debate central.

O simpósio abriu espaço para a discussão de políticas públicas de restauração, tecnologia de sementes, análise, armazenamento e a influência das sementes florestais na mitigação das mudanças climáticas. E, ainda, organização e atuação de redes de coletores e de produtores de sementes florestais. O agravamento dos eventos climáticos ligados diretamente ao desmatamento da Amazônia também foi abordado.

Fátima Piña Rodrigues, professora da Universidade Federal de São Carlos e coordenadora do Programa Nacional de Silvicultura de Nativas, destaca os mecanismos legais de apoio ao produtor na restauração ambiental – incluindo as novas medidas do Plano Safra, que alinham o crédito rural à produção sustentável. Ela cita, entre os resultados a curto e médio prazo, a abertura de novas fontes de recursos, com o mercado de carbono, o pagamento de serviços ambientais ou a própria produção.

“Há uma infinidade de produtos medicinais, tecnológicos, que podem ser tirados dessa área de floresta. Não é só madeira. E o mercado de carbono está aí. A comunidade econômica europeia tem metas e está correndo atrás de 2030”, enfatiza.

Para o pesquisador Santiago Cuada, da Embrapa Agricultura Digital, é preciso desmistificar a ideia de que o crédito de carbono pode ser visto como uma “terceira safra”. “Não existe uma bala de prata, existem diferenças alternativas para continuar tendo acesso ao mercado e receber também um pagamento para esse serviço ambiental”, avalia.

Ele alerta que o valor gerado pelo crédito de carbono, embora benéfico, não é suficiente para ser comparado a uma safra completa. No entanto, o pesquisador afirmou que práticas agrícolas sustentáveis, como o uso de plantas de cobertura e melhores práticas agrícolas, trazem ganhos significativos em produtividade e estabilidade, o que, financeiramente, é muito mais vantajoso para o produtor do que o crédito de carbono isoladamente.

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