No dia 5 de agosto ocorreu de forma on-line uma palestra para os membros da diretoria do Conselho Nacional do Café (CNC), promovida pelo professor Everardo Maciel, consultor tributário, vice-presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) e ex-secretário da Receita Federal (1995-2002). O evento teve como tema a reforma tributária, enviada pelo Governo Federal ao Congresso, que prevê mudanças no sistema brasileiro de tributação.
Everardo Maciel destacou os principais pontos dos projetos apresentados à Câmara e ao Senado. Não descartou a necessidade de se atualizar o sistema tributário brasileiro em vigor, mas acredita que o Brasil deveria eleger as possíveis mudanças de forma pontual. “Não há uma solução única para nada, nem para questões tributárias”, afirmou.
O governo federal encaminhou dois projetos de lei tratando de questões relacionados ao sistema tributário. O primeiro deles, encaminhado ano passado, pretende instituir uma contribuição sobre bens e serviços. O Projeto de Lei 3887/20 cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, em substituição ao Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
“Esse projeto diz que quer simplificar ao fazer a fusão de duas contribuições sociais: Pis e Cofins. Os dois são iguais. Está se fazendo fusão de duas coisas iguais. Até o documento de arrecadação é único. A diferença está na destinação de recursos. O Pis financia o abono salarial e o seguro-desemprego. Cofins é fonte de financiamento da seguridade social. Se faço a fusão vou arrumar uma confusão para saber qual pedaço de cada um”, criticou Everardo Maciel que garante ver na reforma uma tentativa de aumento de carga tributária generalizada, “mais para uns do que para outros”.
Outra mudança criticada pelo professor está nas alterações de opções sobre lucro presumido e lucro real. “Há uma pretensão de fazer uma redistribuição de carga tributária. Quem ganha com isso: cadeias industriais longas. Quem perde com isso: todas as empresas que estão no lucro presumido. O agronegócio todo perde, os prestadores de serviços, as médias, pequenas e micro empresas comerciais e industriais, todos perdem. Tem um aumento brutal de carga tributária para beneficiar algumas cadeias longas industriais”, analisou.
O professor garante que o discurso de reduzir a carga tributária das empresas, na verdade traz embutido a tributação de dividendos. “Estamos falando de 850 mil contribuintes. Dizendo que se quer simplificar, na verdade há uma indisposição enorme com a simplificação. Existe algo mais simples do que o lucro presumido? Todo trabalho (do governo) serve para migrar para o lucro real, aumentando litígio e autuações”.
Imposto de Renda das Pessoas Físicas
Outro projeto que faz parte da reforma promove uma atualização da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). A faixa de isenção sofrerá uma correção de 31%, passando dos atuais R$ 1.903,98 para até R$ 2.500,00 mensais. Com isso, o número de contribuintes que não recolherão o tributo crescerá em 5,6 milhões, passando para 16,3 milhões.
Everardo Maciel argumentou que o texto não traz impactos expressivos para os brasileiros. Nos cálculos do professor, tal mudança proporcionará aumento real de R$ 90,00 por ano ao contribuinte, que corresponde a R$ 7,50 por mês. “Toda essa confusão é para se garantir R$7,50 por mês, e que como todos podem imaginar, não dá pra comprar 1 kg de pão francês”, comparou. Para ele, a classe C será a mais prejudicada se o projeto virar lei. “O projeto diz ainda que o limite só pode ser aplicado entre R$ 30 mil e R$40 mil. Quem está acima de R$ 40 mil não pode ter direito a isso. Com isso, se pretende arrecadar R$ 10 bilhões. Se arrecada R$ 10 bilhões, tirou de alguém. Tirou de quem? Desse pessoal que está acima de R$40 mil, especialmente dos que estão entre R$ 40 mil e R$83,7 mil. Quem é esse pessoal? A classe C”.
Imposto de Renda Pessoas Jurídicas
A reforma também trata de Imposto de Renda sobre as Pessoas Jurídicas. Maciel expôs os motivos pelos quais se posiciona contrário às mudanças, além de criticar a forma como o texto está redigido. Contou que desde 1945, o Brasil retirou a incidência do imposto de renda na distribuição de dividendos, de resultados das empresas. Hoje, só se paga imposto de renda na condição de pessoa física.
“Quem investe em uma empresa está em uma expectativa de ter algum retorno. Como é que se expressa, se materializa esse retorno: no dividendo, no resultado distribuído. Esse resultado, do ponto de vista tributário, ele é afetado por duas tributações: uma que ocorre na própria empresa e na distribuição. Significa dizer que temos três maneiras de tributar isso: ou só na empresa, ou só na distribuição ou na empresa e na distribuição. Eu tenho que eleger a solução que é tecnicamente mais adequada para o Fisco e para o contribuinte”.
Para o professor tributar só na empresa previne uma sonegação fiscal que, segundo ele, é extremamente insidiosa e de dificílimo controle que se chama: distribuição disfarçada de lucros. “Desapareceu no Brasil, não existe mais isso. Há um grau de subjetividade imenso porque dá muito poder ao fiscal. Quando eu assumi a Receita Federal em 1995, parte significativa da fiscalização era destinada a verificar isso. Hoje em dia não existe isso. Não tem interesse nenhum”.
Outra desaprovação de Everardo Maciel está no que chama de vulnerabilidade de arrecadação. Segundo o professor, a distribuição de dividendos se sujeita a fatores exógenos, que não são necessariamente tributários. “Se não há incidência na distribuição, ele não está proibido de aplicar na própria empresa ou aplicar em outra. Quando deixou de se tributar a distribuição a arrecadação cresceu – em termos reais, entre 1996 e 2002 – 117%. É um crescimento sem nenhum padrão de comparação no mundo. A participação do IRPJ no PIB cresceu 50%, não tem nenhum precedente no mundo. Os contribuintes gostaram, apareceu o patrimônio das pessoas. Formalizou, organizou e simplificou”, contou.
Juros remuneratórios
Outro objetivo da reforma segundo Maciel: eliminar o juro remuneratório do capital próprio. O professor revelou que em 18 de maio de 2021, a União Europeia recomendou aos seus países membros que adotassem o juro remuneratório do capital próprio, o mesmo que se tem no Brasil. “Nós demos um passo para trás. Nós voltamos no tempo, 25 anos, para termos novamente os mesmos problemas, com a mesma ineficiência, sob a alegação de que estamos avançando. É justamente o contrário”.
Para Maciel, outro problema da reforma está no impacto que a tributação do Imposto de Renda das Pessoas Físicas gera, ao diminuir diretamente a arrecadação dos municípios. Cerca de 88% das cidades brasileiras têm menos de 55 mil habitantes e contam apenas com o Fundo de Participação dos Municípios – que utiliza o IRPF como fonte de renda. “Entendo como completamente inoportuna a apresentação de um projeto desse tipo. Querem mandar diretamente para o plenário, sem discutir, passando um trator”, finalizou o professor.
Silas Brasileiro, presidente do CNC, destacou que Everardo Maciel é um profundo conhecedor da matéria e que a palestra serviu para levar informação de um especialista sobre um tema que impacta diretamente os produtores brasileiros, incluindo os cafeicultores. “O professor Everardo Maciel é uma das grandes referências sobre temas tributários. Por isso, nossa intenção em oferecer uma discussão de qualidade aos nossos diretores para que possam estar informados de assuntos extremamente pertinentes em voga no nosso país”, finalizou agradecendo o comprometimento de Maciel.
Para conferir o evento completo, clique aqui.
No dia 5 de agosto ocorreu de forma on-line uma palestra para os membros da diretoria do Conselho Nacional do Café (CNC), promovida pelo professor Everardo Maciel, consultor tributário, vice-presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) e ex-secretário da Receita Federal (1995-2002). O evento teve como tema a reforma tributária, enviada pelo Governo Federal ao Congresso, que prevê mudanças no sistema brasileiro de tributação.
Everardo Maciel destacou os principais pontos dos projetos apresentados à Câmara e ao Senado. Não descartou a necessidade de se atualizar o sistema tributário brasileiro em vigor, mas acredita que o Brasil deveria eleger as possíveis mudanças de forma pontual. “Não há uma solução única para nada, nem para questões tributárias”, afirmou.
O governo federal encaminhou dois projetos de lei tratando de questões relacionados ao sistema tributário. O primeiro deles, encaminhado ano passado, pretende instituir uma contribuição sobre bens e serviços. O Projeto de Lei 3887/20 cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, em substituição ao Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
“Esse projeto diz que quer simplificar ao fazer a fusão de duas contribuições sociais: Pis e Cofins. Os dois são iguais. Está se fazendo fusão de duas coisas iguais. Até o documento de arrecadação é único. A diferença está na destinação de recursos. O Pis financia o abono salarial e o seguro-desemprego. Cofins é fonte de financiamento da seguridade social. Se faço a fusão vou arrumar uma confusão para saber qual pedaço de cada um”, criticou Everardo Maciel que garante ver na reforma uma tentativa de aumento de carga tributária generalizada, “mais para uns do que para outros”.
Outra mudança criticada pelo professor está nas alterações de opções sobre lucro presumido e lucro real. “Há uma pretensão de fazer uma redistribuição de carga tributária. Quem ganha com isso: cadeias industriais longas. Quem perde com isso: todas as empresas que estão no lucro presumido. O agronegócio todo perde, os prestadores de serviços, as médias, pequenas e micro empresas comerciais e industriais, todos perdem. Tem um aumento brutal de carga tributária para beneficiar algumas cadeias longas industriais”, analisou.
O professor garante que o discurso de reduzir a carga tributária das empresas, na verdade traz embutido a tributação de dividendos. “Estamos falando de 850 mil contribuintes. Dizendo que se quer simplificar, na verdade há uma indisposição enorme com a simplificação. Existe algo mais simples do que o lucro presumido? Todo trabalho (do governo) serve para migrar para o lucro real, aumentando litígio e autuações”.
Imposto de Renda das Pessoas Físicas
Outro projeto que faz parte da reforma promove uma atualização da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). A faixa de isenção sofrerá uma correção de 31%, passando dos atuais R$ 1.903,98 para até R$ 2.500,00 mensais. Com isso, o número de contribuintes que não recolherão o tributo crescerá em 5,6 milhões, passando para 16,3 milhões.
Everardo Maciel argumentou que o texto não traz impactos expressivos para os brasileiros. Nos cálculos do professor, tal mudança proporcionará aumento real de R$ 90,00 por ano ao contribuinte, que corresponde a R$ 7,50 por mês. “Toda essa confusão é para se garantir R$7,50 por mês, e que como todos podem imaginar, não dá pra comprar 1 kg de pão francês”, comparou. Para ele, a classe C será a mais prejudicada se o projeto virar lei. “O projeto diz ainda que o limite só pode ser aplicado entre R$ 30 mil e R$40 mil. Quem está acima de R$ 40 mil não pode ter direito a isso. Com isso, se pretende arrecadar R$ 10 bilhões. Se arrecada R$ 10 bilhões, tirou de alguém. Tirou de quem? Desse pessoal que está acima de R$40 mil, especialmente dos que estão entre R$ 40 mil e R$83,7 mil. Quem é esse pessoal? A classe C”.
Imposto de Renda Pessoas Jurídicas
A reforma também trata de Imposto de Renda sobre as Pessoas Jurídicas. Maciel expôs os motivos pelos quais se posiciona contrário às mudanças, além de criticar a forma como o texto está redigido. Contou que desde 1945, o Brasil retirou a incidência do imposto de renda na distribuição de dividendos, de resultados das empresas. Hoje, só se paga imposto de renda na condição de pessoa física.
“Quem investe em uma empresa está em uma expectativa de ter algum retorno. Como é que se expressa, se materializa esse retorno: no dividendo, no resultado distribuído. Esse resultado, do ponto de vista tributário, ele é afetado por duas tributações: uma que ocorre na própria empresa e na distribuição. Significa dizer que temos três maneiras de tributar isso: ou só na empresa, ou só na distribuição ou na empresa e na distribuição. Eu tenho que eleger a solução que é tecnicamente mais adequada para o Fisco e para o contribuinte”.
Para o professor tributar só na empresa previne uma sonegação fiscal que, segundo ele, é extremamente insidiosa e de dificílimo controle que se chama: distribuição disfarçada de lucros. “Desapareceu no Brasil, não existe mais isso. Há um grau de subjetividade imenso porque dá muito poder ao fiscal. Quando eu assumi a Receita Federal em 1995, parte significativa da fiscalização era destinada a verificar isso. Hoje em dia não existe isso. Não tem interesse nenhum”.
Outra desaprovação de Everardo Maciel está no que chama de vulnerabilidade de arrecadação. Segundo o professor, a distribuição de dividendos se sujeita a fatores exógenos, que não são necessariamente tributários. “Se não há incidência na distribuição, ele não está proibido de aplicar na própria empresa ou aplicar em outra. Quando deixou de se tributar a distribuição a arrecadação cresceu – em termos reais, entre 1996 e 2002 – 117%. É um crescimento sem nenhum padrão de comparação no mundo. A participação do IRPJ no PIB cresceu 50%, não tem nenhum precedente no mundo. Os contribuintes gostaram, apareceu o patrimônio das pessoas. Formalizou, organizou e simplificou”, contou.
Juros remuneratórios
Outro objetivo da reforma segundo Maciel: eliminar o juro remuneratório do capital próprio. O professor revelou que em 18 de maio de 2021, a União Europeia recomendou aos seus países membros que adotassem o juro remuneratório do capital próprio, o mesmo que se tem no Brasil. “Nós demos um passo para trás. Nós voltamos no tempo, 25 anos, para termos novamente os mesmos problemas, com a mesma ineficiência, sob a alegação de que estamos avançando. É justamente o contrário”.
Para Maciel, outro problema da reforma está no impacto que a tributação do Imposto de Renda das Pessoas Físicas gera, ao diminuir diretamente a arrecadação dos municípios. Cerca de 88% das cidades brasileiras têm menos de 55 mil habitantes e contam apenas com o Fundo de Participação dos Municípios – que utiliza o IRPF como fonte de renda. “Entendo como completamente inoportuna a apresentação de um projeto desse tipo. Querem mandar diretamente para o plenário, sem discutir, passando um trator”, finalizou o professor.
Silas Brasileiro, presidente do CNC, destacou que Everardo Maciel é um profundo conhecedor da matéria e que a palestra serviu para levar informação de um especialista sobre um tema que impacta diretamente os produtores brasileiros, incluindo os cafeicultores. “O professor Everardo Maciel é uma das grandes referências sobre temas tributários. Por isso, nossa intenção em oferecer uma discussão de qualidade aos nossos diretores para que possam estar informados de assuntos extremamente pertinentes em voga no nosso país”, finalizou agradecendo o comprometimento de Maciel.
Para conferir o evento completo, clique aqui.
As informações são do CNC.