Desconhecimento dificulta análise de informações que a agricultura de precisão possibilita

“Alguns produtores não utilizam praticamente nada, por falta de informações e de conectividade”, segundo o diretor do Instituto Mato-Grossense de Algodão

Criada para identificar as diferenças de produtividade do solo e áreas mais afetadas por pragas a fim de aplicar a quantidade correta de fertilizantes e insumos, entre outras funções, a chamada agricultura de precisão está presente em grandes propriedades. Mas ainda enfrenta obstáculos para ser adotada em larga escala no país.

Embora os primeiros maquinários de aplicação variável de insumos e monitoramento da colheita tenham começado a ser introduzidos no Brasil no início dos anos 90, boa parte dos produtores rurais ainda carecem de informação sobre o rol de tecnologias disponíveis no mercado e não sabem como extrair o máximo do potencial da inovação tecnológica.

Pesquisa realizada pela empresa Kleffmann Group e apresentada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) mostra que, de um universo de 992 produtores entrevistados, 45% responderam que utilizam alguma técnica de agricultura de precisão na propriedade, como aplicação de sementes em população variável, pulverização e fertilização em doses variáveis, e mapeamento da fertilidade do solo.

O levantamento feito entre produtores de soja, trigo e milho revela que, deste universo, pouco mais de 15 % dos produtores utilizam, de fato, técnicas de amostragem de solo para obter mapas com diagnósticos da variabilidade espacial da fertilidade da terra. O resultado equivale a 9 milhões de 59 milhões de hectares pesquisados.

A pesquisa foi feita em 2013 nas regiões Sul, Cerrado e Matopiba (composta pelos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). O estudo identificou ainda que a tecnologia mais adotada pelos produtores é o uso de piloto automático e que 58% dos agricultores tinham intenção de continuar investindo em novas tecnologias.

O professor José Paulo Molin, coordenador do Laboratório de Agricultura de Precisão da Usp-Esalq, justifica que a adesão ainda é baixa, pois o assunto é muito novo no mercado, com cerca de 16 anos de existência, fator que acarreta uma certa limitação do entendimento sobre a atividade.

Ele resume que o principal desafio neste cenário é o acesso ao conhecimento e aos investimentos. “Tem que conhecer para entender e fazer. E, se quiser fazer, tem que ter algum empenho financeiro. Então, o que precisa é massificação da informação, divulgar em todos os níveis por meio de formadores de opinião para que adquira valor nas comunidades”, recomenda Molin.

O pesquisador Ricardo Inamasu, da Embrapa Instrumentação, em São Carlos (SP), destaca que o sistema ainda é complexo e exige muita informação, o que torna a adoção complicada pelos agricultores.

“Nós desenvolvemos muito conhecimento, mas é um pouco difícil de ser absorvido pelo setor produtivo. Nós temos uma porcentagem significativa de produtores que já adotam agricultura de precisão, mas para aumentá-la, entendemos ser necessário desenvolver procedimentos mais adequados que favoreçam a aplicação”.

Parceria

Pesquisadores da Embrapa, de instituições privadas e produtores de diferentes culturas fazem parcerias para ampliar a adoção da agricultura de precisão nas propriedades e otimizar o uso de tecnologias. Um dos trabalhos da Embrapa está sendo realizado junto ao Instituto Mato-Grossense do Algodão (IMA).

Segundo o diretor-executivo do IMA, Álvaro Salles, por meio da parceria o instituto está desenvolvendo metodologias e procedimentos para facilitar o uso das tecnologias. O IMA entra com recursos e o trabalho em campo e a Embrapa com o apoio técnico de pesquisadores de ponta na área.

“Lançamos um desafio junto com a Embrapa para desenvolver um sistema que sirva ao produtor para a tomada de decisões a tempo de corrigir eventual distorção de produção, da lavoura ainda para esta safra”, comenta.

Salles destaca que a maior dificuldade entre os produtores da região é interpretar as informações colhidas em campo pela tecnologia e utilizá-las em tempo hábil. Ele defende que esta lacuna seja superada com investimento em pesquisa e capacitação.

“O desafio é realmente pesquisa e correlacionar os dados, porque a tecnologia está correndo muito mais rápido do que o conhecimento disponível”.

O produtor relata que o projeto permitiu identificar que poucos produtores de soja e algodão do Mato Grosso utilizam todo o potencial da tecnologia disponível no mercado.

“Alguns produtores não utilizam praticamente nada, muito por desconhecimento e falta de conectividade. Compram uma máquina nova que tem todo o aparato, tecnologia embarcada, mas junto de máquinas antigas que não dispõem dessa tecnologia”, comenta Salles.

Mobilização

Com o apoio do Mapa e da comissão de agricultura de precisão foram criadas duas associações nacionais para organizar a aplicação desses mecanismos. As entidades têm mais de 100 empresas associadas e enviado representantes a eventos internacionais para conhecer novas tecnologias e formas de fazer agricultura que podem ser adaptadas ao Brasil.

Além das parcerias de assistência técnica, o Mapa ainda trabalha para aperfeiçoar a legislação que envolve o tema, entre elas, a lei geral de proteção de dados. Aprovada no ano passado pelo Congresso Nacional, a lei estabelece regras de controle e de privacidade de informações pessoais. Porém, integrantes do setor agropecuário avaliam que ainda é necessário maior rigor para evitar que os dados coletados em campo sejam utilizados de forma inadequada.
“Hoje, o campo está coletando muita informação. De quem realmente são os dados que esses prestadores de serviço estão coletando para o produtor? O produtor está pagando, mas a empresa está recebendo, manipulando, filtrando, lapidando os dados”, questiona Juntolli.

O setor também quer um marco legal para estimular a aplicação das técnicas inovadoras de produção no Brasil. No Congresso Nacional tramitam dois projetos de lei para criar uma Política Nacional de Incentivo à Agricultura e à Pecuária de Precisão. Uma é de autoria da ministra Tereza Cristina.

Fonte: Débora Brito

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