Antes de discorrer sobre o tratamento de sementes e seus benefícios, vamos falar sobre a soja no Brasil. Atualmente, o Brasil destaca-se como o maior produtor mundial desta commodity, com uma área cultivada de aproximadamente 40,9 milhões de hectares e produtividade média de 3.026 kg ha-1, atingindo na safra 2021/22 uma produção de 123,8 milhões de toneladas de grãos (CONAB, 2022).
Diante da expressividade da soja no Brasil, deveria ser uma pergunta-chave: dentre as possibilidades de manejo, quais manejos estão relacionados positivamente ao bom start da lavoura, garantindo manter a qualidade da semente, o arranque inicial rápido e saudável das plântulas e o estabelecimento do estande adequado e homogêneo?
Sem dúvidas, manejo correto do solo, utilização de semente de alta qualidade (física, fisiológica (germinação e vigor), genética e sanitária), época de semeadura e o tratamento de sementes (TS) estariam entre as práticas mais relevantes.
Tratamento de sementes
Como o foco é TS, precisamos nos atentar para alguns números: é uma prática que está no mercado desde 1981, logo, completando 41 anos de existência e sem prazo de validade, pois embora o conceito teórico da prática permaneça, está em constantes inovações.
Em outra ótica, de acordo com a literatura, tem-se que no Brasil sementes portadoras de agentes causadores de doenças são a causa de perdas de produtividade da ordem de 10 a 20%.
Considerando a produção atual de soja, por exemplo, teríamos perdas anuais entre 12,4 e 24,8 milhões de toneladas de grãos. Deste modo, a utilização de manejo preventivo, a exemplo o TS, é fundamental para manter os patamares de produção e claro, maiores produtividades por unidade de área.
Mas afinal, o que é TS?
O TS de soja é caracterizado pela aplicação de insumos diretamente sobre as sementes, distribuídos uniformemente para garantir a proteção e/ou manutenção da qualidade das sementes ou auxiliar no desenvolvimento das plântulas em condições adversas do ambiente.
Se feita adequadamente, essa prática protegerá a semente nas fases iniciais da lavoura, desde a semeadura até a emergência da plântula.
Atualmente, o tratamento de sementes pode conglomerar não apenas os defensivos (fungicidas, inseticidas e nematicidas), mas todas as tecnologias aplicadas à semente, como: bioestimulantes, hormônios, reguladores de crescimento, micronutrientes, inoculantes, co-inoculantes e polímeros.
Tais tecnologias protegem a qualidade da semente, promovem o arranque inicial rápido e saudável das plântulas e, como consequência, um estabelecimento de estande adequado e homogêneo.
Nessas condições, o produtor garante um bom start da lavoura e, a partir deste momento, a estratégia é investir para estimular a expressão do potencial produtivo da cultura, pois terá uma lavoura responsiva.
Recomendações
Existem duas opções formalizadas: TS realizado na propriedade agrícola (on farm) ou industrial (TSI). Ambas as opções, se bem realizadas, são funcionais, contudo, a maioria dos produtores mantém o método tradicional “on farm”.
Entretanto, uma parcela significativa de aproximadamente 42% dos produtores está preferindo o TSI, com aumento expressivo na sua utilização, principalmente nas últimas safras.
Em partes, pode estar associado às vantagens proporcionadas pelo TSI, como: precisão do volume de calda e quantidade de sementes, cobertura uniforme, dose adequada (precisão na quantidade do fungicida, inseticida), qualidade garantida das sementes, evita risco de intoxicação dos operadores, padrão de segurança garantido, tratamento de elevada qualidade, agrega valor ao produto (semente), além de proporcionar maior rendimento por hora de trabalho (capacidade para tratar até 30 toneladas de sementes por hora).
Vale a ressalva – independentemente do método TS utilizado, deve-se tomar cuidado com os pacotes ofertados no mercado, pois muitas vezes é utilizada uma ampla gama de produtos na mesma semente, como a combinação de fungicidas, inseticidas, bioestimulantes, hormônios, reguladores de crescimento, micronutrientes, inoculantes, coinoculantes e polímeros, que podem causar fitotoxicidade às sementes, além do impacto ambiental negativo pelo excesso de produtos utilizados.
Estratégias para manter altas produtividades
Um primeiro ponto, independente das condições ambientais: o TS sempre deve ser realizado, pois trata-se de uma prática barata em função de todos os benefícios proporcionados. Em média, o custo com o TS representa 3,3% do custo total com soja gasto por hectare.
Proporcionalmente, considerando um média de custo total com soja de R$ 3.941,3/ha, esta porcentagem representa um valor investido com o TS de R$ 130,06/ha.
Quadro 01 – Custo total de produção da soja e o custo com o tratamento de sementes (TS) representado através da porcentagem de participação do custo total por região. Média das últimas cinco safras.
Região | Custo total (R$/ha) | Variação custo TS (%) | Média custo TS (%) |
Sul | 4531,7 | 1,4 – 5,7 | 3,4 |
Sudeste | 4195,8 | 2,6 – 4,6 | 3,4 |
Centro Oeste | 3985,2 | 1,9 – 4,6 | 3,3 |
Nordeste | 3052,7 | 0,9 – 4,5 | 3,0 |
Média | 3941,3 | — | 3,3 |
Quando se tem sementes contaminadas com fungos fitopatogênicos (característica de sementes de baixa qualidade), condições de semeadura improprias, tanto no âmbito de clima (baixa humidade do solo, chuvas intensas, temperaturas extremas) quanto edáficas e operacionais (solo descoberto, desestruturado, compactado, semeadura profunda) e em sistema de rotação de cultura ou cultivo em áreas de abertura, a prática do TS torna-se mais estratégica.
Isso acontece porque o combo tecnológico utilizado diretamente na semente combate condições de adversidade, ou seja, protege a sanidade da semente, controla o ataque de pragas, mantém boas taxas de germinação e vigor de plântulas e, como consequência, garante um estande final de plantas ideal, evitando custos extras de reimplementação da lavoura.
Por onde começar
O primeiro passo para ter êxito do TS é mapear o ambiente quanto ao histórico da área, tipo de sistema de cultivo utilizado, cultura anterior, pragas e fungos comuns na área, etc. Tais informações são de fundamental importância.
Um exemplo é a escolha do mais indicado inseticida e fungicida, que exige saber as principais pragas e fungos da área, para garantir a eficiência no controle (modo de ação e espectro de controle), evitar fitotoxidade e aumentar a relação custo/benefício.
Este é um raciocínio simples, porém, pode ser utilizado com outras tecnologias que podem ser aplicadas diretamente na semente também. É fundamental atender os requisitos e exigências da cultura, desde a semeadura até a emergência, assim promovendo expressar o potencial produtivo e manter altas produtividades.
Quadro 2 – Principais pragas e fungos causadores de danos da semeadura até a emergência da plântula de soja.
Pragas | Fungos |
Sternuchus subsignatus (tamanduá-da-soja) | Phomopsis (queima da haste e vagem) |
Demodema brevitarsis (coró) | Colletotrichum dematium (antracnose) |
Diloboderus abderus (coró) | Cercosora kikuchii (mancha púrpura) |
Diabrotica speciosa (vaquinhas) | Macrophomina faseolina (podridão raízes) |
Elasmopalpus lignosellus (lagarta elasmo) | Rhizoctonia solani (tombamento) |
Bemisia sp. (mosca branca) | Sclerotinia sclerotiorum (podridão branca haste) |
Anticarsia gemmatalis (lagarta-da-soja) | Fusarium sp. |
Novidades no TS
O TS focado em soja e outras culturas de interesse econômico sempre está se inovando. Hoje podemos contar com tecnologias de alto nível tecnológico, a exemplo: produtos associando eficiência agronômica e segurança na aplicação, buscando fornecer maior eficiência na absorção de nutrientes, sistema radicular profundo, oferecendo maior tolerância a veranicos e facilidade operacional, conferindo uniformidade sobre as sementes.
Há produtos que, além de oferecerem nutrição balanceada da germinação à emergência e estímulos fisiológicos na sementes, também melhoram a fluidez e a plantabilidade, e produtos segmentados, a exemplo, destinados para o mercado de TSI associando nutrição e balanço hormonal em uma formulação em pó, caracterizando maior praticidade e segurança operacional.
Viabilidade
A prática de TS vem sendo utilizada por um número cada vez maior de produtores, principalmente devido à ótima relação benefício/custo:
– Estabelecimento da população de plantas por controlar patógenos e pragas importantes transmitidos pelas sementes;
– Estabelecimento do estande desejável da lavoura;
– Proteção do potencial genético da variedade;
– Influência positiva na fisiologia da planta (melhor enraizamento, germinação mais uniforme e maior resistência a nematoides);
– E, claro, é um investimento relativamente baixo, que ajuda a melhorar a produtividade da lavoura.
Assim, pode-se considerar que o tratamento de sementes é um “seguro super barato” que o agricultor faz no início da implantação de sua lavoura.
João Pascoalino
Gerente de Serviços Digitais e consultor
Por: Revista Campos e Negócios