por Prof. José Donizete Alves via Peabirus
Postado em 15/09/2020
O volume e a uniformidade da florada é extremamente decisivo para a produtividade
O florescimento do cafeeiro inicia-se a partir do segundo ano em campo após as chamadas “chuvas de florada”, que são precedidas por longos períodos de deficiência hídrica, momento em que as gemas estão em dormência por conta do alto nível de ácido abscisico, um inibidor da floração.
A maioria das flores se abre na primeira hora de um dia de sol, com uma tendência decrescente até às 9 horas da manhã, onde cerca de 92% das flores já foram polinizadas, momento em que o grão de pólen entra em contato com o óvulo completando a fertilização. Depois das 11 horas da manhã, a possibilidade de vingamento das flores é mínima em razão da baixa receptividade do estigma ao grão de pólem. Na prática, isso implica em dizer que, quando a flor se abre, os frutos em seu estádio inicial já foram formados. De maneira geral, as flores caem após 8 horas do início da abertura, mas, em certos casos, podem durar até três dias. Durante esse período, elas permanecem atrativas aos polinizadores, especialmente no primeiro dia, em que o néctar produzido pode conter até 38% de açúcar. Como todas as flores não se abrem ao mesmo tempo, o processo de antese se estende por mais dois a três dias. Depois da fecundação do óvulo, a próxima etapa é o “pegamento da florada”, dando início ao desenvolvimento do fruto.
A florada é, sem dúvida alguma, a etapa mais estudada do florescimento. Há muito está fundamentado que ela acontece na transição do inverno para a primavera depois de um longo período seco, alta amplitude térmica, baixa umidade do ar e, na sequência, chuva fraca ou moderada. Depois desses eventos, a flor abre e o ovário já se transformou em primórdio de fruto em um processo popularmente conhecido como pegamento da florada. Mas para que o fruto se fixe na roseta no período de pós-florada são necessárias temperaturas do ar mais amenas e, internamente, um certo teor de umidade que favoreça as divisões celulares e mantenha elevada a relação promotores:inibidores do crescimento, de modo a evitar o abortamento e para que o fruto se desenvolva para o estádio chumbinho.
Para um melhor entendimento dos efeitos do clima sobre o pegamento dos frutos, destacamos três cenários comentando cada um deles:
I. Preferencialmente, é desejável que as chuvas continuem leves a moderadas até mais ou menos o 15º ou 20º dias após a florada.
Comentário: Essa condição que é a ideal, mas atualmente está muito longe da realidade, pois garante ótimo pegamento da florada e início satisfatório do desenvolvimento do fruto por conta do bom volume de água armazenada no solo e as temperaturas amenas no período. Na melhor das hipóteses, esse é o sonho dos cafeicultores.
II. É comum (*) que haja uma estiagem na pós-florada (período até o 15º ou 20º dias após a florada), mas é importante que o solo não entre em déficit hídrico acentuado.
Comentário: Para que isso não aconteça, as chuvas que desencadearam a florada (chuvas de pré-florada) devem ser fortes o suficiente para repor a água no solo e fraca o bastante para não derrubar os botões florais/flores. Se essa conjunção de fatores acontecer, as temperaturas altas no período passam a ser o principal entrave que pode levar ao abortamento das flores, o pegamento dos frutos e o crescimento dos frutinhos. Esse cenário II não reflete a realidade atual nas regiões cafeeiras, uma vez que as chuvas de florada são fracas, o solo se encontra com déficit hídrico acentuado e as temperaturas na pós-florada estão muito elevadas. Portanto, o paraíso delineado no canário I não vai acontecer e, por conta disso, podemos esperar perdas na produção de café do ano que vem.
III. Chuvas de florada fracas e estiagem no período pós-florada acompanhado de altas temperaturas.
Comentário: Na atualidade, esse cenário é o que mais se aproxima da realidade, uma vez que antes das chuvas da florada, que foram de intensidade fraca a moderada, tivemos um longo período de seca, que em muitos casos durou cerca de 120 dias. Como toda a estiagem, ela foi acompanhada de altas temperaturas e essa condição perdura até hoje. Portanto, o mais provável é que as perdas decorrentes dessa florada para o próximo ano sejam bem maiores que aquelas esperadas no cenário II.
(*): Ultimamente e com muita frequência, ouvimos falar que as adversidades climáticas estão se tornando comuns e, portanto, normais. É bom destacar que nem sempre o que é comum, ou seja, que acontece com frequência, pode ser considerado normal. Infelizmente, acabamos aceitando um fato comum, mas que não deveria acontecer, como um fato normal.
Nota complementar: Um assunto que gera dúvidas sobre a biologia da flor do C. arabica é a possibilidade da fecundação cruzada contribuir para aumentar a capacidade produtiva do café autógamo. Pesquisas realizadas em 1945 apontaram que a percentagem de hibridação sob o efeito do vento, dos insetos e da gravidade variou de 7,3 a 9%. Posteriormente, em 1991, ficou demonstrado uma variação de 1,7 a 33,9% na taxa de cruzamento natural em Icatu, presumivelmente em razão da autoincompatibilidade apresentada pela espécie C. canephora Pierre, um dos ancestrais desse material. De maneira geral, as flores caem após 8 horas do início da abertura, mas em certos casos podem durar até três dias, período em que permanecem atrativas aos polinizadores, especialmente no primeiro dia, onde o néctar produzido pode conter até 38% de açúcar às 8 h da manhã. Outros estudos apontando que a taxa de cruzamento natural pode ser bem mais variável, a depender da cultivar envolvida, abriram novos campos para o uso comercial de abelhas como agentes polinizadores capazes de aumentar a produção de café. Uma vez que as variedades comerciais de café arábica apresentam pequena variabilidade genética e que os resultados encontrados na literatura são ainda muito contraditórios, há a necessidade de mais estudos.