Região que já produziu café no século XIX ressurge com Identificação Geográfica e potencial de lotes especiais
Há cinco anos, Pardinho, município a cerca de 200km da capital paulista, tem sido requalificado como área produtora de cafés arábica. Ali, o grão brotou no século XIX, mas passou por uma crise nos anos 1930, o que fez o cultivo ser timidamente retomado vinte anos depois. Entre oscilações de safras de café, houve espaço para outros produtos colocarem à cidade no radar internacional, como o queijo premiado.
O café ficou em segundo plano, cenário que produtores querem transformar. Um dos diferenciais é que o solo possui minerais provenientes do basalto, e regiões de maior altitude ou geograficamente classificadas como ‘cuestas’ podem ter presença arenito-basálticas, formações de relevo compostas por rochas vulcânicas, o que faz do solo um diferencial para cultivo de cafés especiais.
“Tirando a Illy, meu café fica todo no Brasil. Meu desejo é que os nossos melhores produtos fiquem dentro de casa, porque eu desejo que o brasileiro tome café”, defende a produtora.
Entre os principais desafios da atividade, Daniella cita que a padronização da qualidade entregue por safra é o principal, especialmente pelo grão ser uma cultura perene e que requer cuidados minuciosos. “É difícil repetir resultado e é isso que estamos conseguindo fazer aqui e o que desperta interesse de compra de grandes indústrias. Apesar de todas as adversidades que a gente possa passar, a gente consegue repetir o resultado olhando para o futuro do café”, agrega.
Para atingir bons resultados, o investimento foi em mecanizar 65% da colheita, apesar de ela não falar em números. Ao ano, costuma vender direto à indústria italiana de 100 sacas a 120 sacas de 60 quilos. “Parece pouco”, pondera Daniella, mas é metade de sua produção e compõe o blend de grãos brasileiros que a Illy compra.
Como diferencial, ela considera seu método de “descanso do café”. “O grão descansa nas tulhas por 30 dias depois de ter passado pela secagem no método via úmida. Só então ele é beneficiado”, descreve. Isso ajuda na maturação do café, diz a produtora, embora alerte que as condições climáticas e o tipo de grão muitas vezes impõem um ritmo diferente no trabalho.
No trato dos talhões, ela caminha para 60% de uso de biológicos em seus pés de cafés e investe em sementes de feijão e outras gramíneas como planta de cobertura. Ao redor do cafezal, há 12 hectares de mata nativa que foram plantados com o aval dela, o que ela classifica como “levante de mata”.
Na expectativa de ter a maior colheita na safra 2024/25, ela sabe que o cuidado com os detalhes será crucial, já que a seca e alta temperatura da região provocou danos nos frutos e nos grãos.
Cafeicultores de Pardinho
No total, Pardinho possui 600 hectares de café plantados com fins comerciais atualmente, o que Daniella considera pouco, embora preveja uma movimentação dos produtores para investir no cultivo e retomar o plantio no município. Ano passado, inclusive, esses cafeicultores conseguiram montar a Associação da Cuesta Paulista, que envolve os municípios de Anhembi, Avaré, Bofete, Botucatu, Itatinga, Paranapanema, Pardinho, Pratânia, São Manuel e Torre de Pedra.
Ainda são 30 associados, diz ela, mas o potencial de crescimento existe e é uma forma deles tentarem pleitear a tão sonhada Indicação Geográfica (IG), que já está tramitando e pode agregar valor ao produto na região.
Entre os produtores de café de Pardinho, Daniella é uma das mais conhecidas e ocupa cargo no Sindicato Rural e Faesp para representar o produto “com aroma da Cuesta”, ressalta a cafeicultura que já até deu dicas de plantio para a apresentadora Ana Maria Braga.
Além dela, outra produtora premiada da região é Beatriz Burkcas Guerra, da Fazenda Águas do Janeiro, que é de pequeno porte e alcançou uma qualidade em um microlote que foi ganhador do Concurso de Cafés Especiais de Pardinho e Região, realizado pelo Sistema Faesp/Senar e Sindicato Rural de Pardinho
Para ela, “a generosidade da terra é que fornece a qualidade do café”. Sua propriedade fica a 950 metros de altura em terras basálticas, área de transição entre a Mata Atlântica e Cerrado, bem acima do Aquífero Guarani.
A geada de 1975 queimou 7 mil pés de cafés que existiam na fazenda, quando ela foi comprada pela família de Beatriz, como lembra a produtora. Atualmente, são 150 mil pés de cafés direcionados à produção de alta qualidade com variedades como o bourbon amarelo e araras, as preferidas de empresas de café regionais que lançam microlotes a partir de grãos de cafeicultores como ela.
A produtora acrescenta, ainda, que as pesquisas e as inovações que estão sendo testadas na região nos últimos anos ajudam a veicular o potencial da Cuesta Paulista como área de cafés de alto nível, assim como a Alta Mogiana e o Cerrado Mineiro.
A reputação recuperada vai acelerar também a economia do local e pode atrair mais produtores para a atividade do café, agrega ela, mesmo com os detalhes e as dificuldades climáticas.